por
Thalita Rebouças
Domingo nublado, dia
perfeito para se esparramar no sofá e esperar o FlaXFlu. Acordei, confeço, já sonhando como meu Fluzão, que certamente
ganharia de lavada dos rubro-negros. Ô, dia feliz.
_____
Pai, vamos visitar a Bienal do Livro? -
pediu Malu, a minha primogênita.
_____ Não,
querida. Hoje é dia de jogo. Fala com a mamãe. Isso é coisa pra mamãe.
_____ Mamãe
uma ova! Tá louco! É coisa para a mamãe, para o papai e para os queridos
irmãos. Programa para a família toda. TO-DA! – esbravejou Angela Cristina,
minha sempre doce esposa
A família toda
naquela feira lotada? Uma criança de oito anos, outra de seis e uma de cinco
andando por aqueles intermináveis pavilhões? E o meu jogo?
_____ Armando, o jogo é à tarde, dá tempo de ir à
Bienal e voltar pra ver essa porcaria – disse Angela.
_____ Na boa, pai ver o jogo pra
quê?! O Flamengo ganha sempre, você precisa se acostumar.
____Malu,
meu amor, quando a gente não é Flamengo, a gente torce contra. Papai já não
explicou mil vezes?
____ Mas eu gosto do meu time, o Botafogo e do
Flamengo.
____ Não existe isso, Malu! __ gritei, sem paciência
para tamanha falta de cultura futebolística. Tadinha, ela era só uma pirralha
de oito anos. Como é difícil ser pai – Não, não chora, vem cá, o papai é um
idiota mas te ama tanto... Desculpa...
____ Desculpo
só se você for pra Bienal comigo.
Droga! Criança
esperta!
____ Tá bom. Mas às
quatro eu tenho que estar em casa hein?
____ Ebaaaaa!!!
__ gritou a minha menina.
Levamos mais ou menos
uma hora e meia para sair de casa (mulheres demoram pra se arrumar desde
pequenas). Pegamos o trânsito para ir, engarrafamento no estacionamento, fila
para comprar, fila para entrar. E ainda dizem que brasileiro não lê. Tá bom!
Os meus filhos
ficaram boquiabertos diante de tantos livros. Deu orgulho.
___ Quero este, este,
este aqui também! __ gritavam os três, sem parar, já no primeiro estande que
visitamos.
Deu pena do meu
bolso, mas tudo bem. Gastar com livros dá muito mais prazer do que gastar com
joguinhos, equipamentos eletrônicos e afins.
___ Todo mundo já
comprou tudo o que queria? __ perguntou
Malu, depois de uma hora.
___ Acho que sim, por
quê? __ Quis saber Angela Cristina.
___ Porque chegou a
hora de ver o Ziraldo. Vamos?
Ah, que graça. A Malu
estava encantada com o Menino Maluquinho. Ela tinha adorado o livro do
personagem com a panela na cabeça. Não via a hora de conhecer o escritor que
inventara o tal menino. Quase chorei.
Fomos ao estande onde
Ziraldo autografava e quase chorei de novo. A fila estava grande, dava voltas. Centenas
de pessoas esperavam por uma assinatura do pai do Maluquinho.
___ Filha, Você não
vai querer entrar nessa fila gigante, né?Hoje tem jogo, jogo importante! E essa
fila vai durar umas duas horas, no mínimo!
___ Mas eu quero
falar com ele!
___ Hoje não vai dar.
A gente passa na frente dele, papai levanta você, e você dá tchau. Combinado!
___ Não! Eu preciso
falar com ele!
___ Falar o quê? O
que você acha que tem pra falar com Ziraldo?
___ Buáááá!
___ Armando! Olha o
que você fez! Fila com choro ninguém merece! __ brigou Angela Cristina já se
encaminhando com a prole para a fila quilométrica.
Tremi, suei frio. Eu
não podia perder o jogo. Era importantíssimo!
Mas o que a gente não
faz pelos filhos?
Ficamos na fila por
duas horas e trinta e sete minutos. Eu estava exausto, já sem esperança de ver
o jogo e, admito, com um pouco de ciúme do Ziraldo. Afinal , mesmo sem nunca
tê-lo visto pessoalmente, Malu nutria por ele um amor quase incondicional.
Chegou a hora. Os
olhinhos da minha filhota brilharam ao ver de perto aquele senhor simpático, de
colete colorido e cabecinha branca. Ela estava tão feliz. Tão feliz...
___ Realizei meu
sonho __ comemorou, depois de ganhar autógrafo e beijo do seu escritor
preferido __Vamos para casa ver o jogo, papai?
___ Jogo? Que jogo? __
brinquei, ainda extasiado com a alegria que havia proporcionado para minha
filha.
___ Desistiu do jogo?
Ebaaa! Então vamos ver a Ana Maria Machado, ela está aqui também! __ berrou
Malu empolgada que só ela.
___ Depois vamos ver
o Pedro Bandeira.
___ Esse eu não
conheço, mamãe.
___ Mas vai conhecer.
E vai se encantar __ adiantei.
No dia seguinte, cheguei cedo ao trabalho.
___ Como foi o seu
domingo? __ perguntei a um colega na redação do jornal em que eu trabalhava.
___ Uma lástima! Fui a um show de banda pop.
Gastei dinheiro, peguei fila, aturei gritos histéricos e ouvi música ruim.
Muita música ruim. E o seu? Viu o FLAXFLU?
___ Que nada! Passei
a tarde com meus filhos na Bienal do Livro. E descobri que eles não idolatram
bandas, muito menos artistas de tevê. Os ídolos deles são escritores __ disse
todo orgulhoso __ Quer coisa melhor que isso?